
"Não façamos política gratuita com algo que é tão grave e que realmente merece a atenção e a serenidade de todos", afirmou a ministra de Estado, da Defesa Nacional e dos Assuntos Parlamentares, Janine Lélis, na Assembleia Nacional, na Praia, na primeira sessão parlamentar ordinária de abril.
O Partido Africano da Independência de Cabo Verde (PAICV, oposição) responsabilizou, nesta sessão parlamentar, o Governo pelo incêndio, afirmando que demonstrou igualmente a ausência de meios no país.
"É preciso assacar responsabilidades e fazer justiça, para honrar aqueles que morreram, para responder ao clamor das populações, para devolver a autoestima dos cabo-verdianos e para salvar o Estado de Direito. A tragédia de Serra Malagueta deixou escancarado um país sem as condições para enfrentar crises desta natureza", acusou o PAICV, na sua declaração política, lida pela deputada Carla Carvalho.
Em causa está o incêndio que deflagrou em 01 de abril, pelas 10:30 locais (12:30 em Lisboa), na Serra Malagueta e Figueira das Naus, ilha cabo-verdiana de Santiago, 50 quilómetros a norte da Praia, cuja coordenação ao combate foi assumida pela Proteção Civil de Cabo Verde com apoio no terreno de militares e bombeiros. No dia seguinte, uma viatura das Forças Armadas de Cabo Verde despistou-se cerca das 17:20 locais, acidente que provocou a morte a oito militares, tendo ainda morrido nestas operações um técnico daquele parque.
"De facto, o país viveu uma tragédia. Uma tragédia que afetou e perturbou a todos nós, mas nós temos que ter sempre presente que os militares foram em resposta ao cumprimento de uma missão. Eles foram acudir e socorrer, como em tantas outras situações e em tantas outras vezes estiveram em prontidão para responder à nação", afirmou Janine Lélis.
"Os incêndios acontecem, lamentavelmente estes não foram os primeiros. Os incêndios acontecem em países onde há meios significativos. Não há forma de efetivamente conseguir fazer a prevenção absoluta em relação aos incêndios. Os incêndios também aconteceram naquilo que é a governação do PAICV e é neste contexto que nós temos que ter sempre presente que esses factos acontecem", acrescentou.
Durante o debate que se seguiu à declaração política, o Movimento para a Democracia (MpD, no poder desde 2016), acusou o maior partido da oposição de fazer "aproveitamento político" deste caso, enquanto o líder do grupo parlamentar do PAICV, João Batista Pereira, exigiu um inquérito "rigoroso e independente" a este caso, envolvendo além dos militares também populares e outras entidades, para "cabal" esclarecimento dos acontecimentos.
Cinco militares envolvidos no despiste no perímetro do PNSM permanecem internados no Hospital Universitário Agostinho Neto, na Praia, e 19 estão em recuperação na Policlínica das Forças Armadas.
"Lamentavelmente, aconteceu um acidente de viação. As vidas foram perdidas neste acidente de viação. E eu devo dizer, como é do domínio do conhecimento público, que o chefe de Estado-Maior das Forças Armadas, na sua primeira comunicação, anunciou que vai-se fazer um rigoroso inquérito para se apurar e compreender as causas do acidente", salientou a ministra.
"Neste sentido, qualquer precipitação no sentido de rotular esse inquérito como inquérito político, como hoje aqui foi dito, põe em causa aquilo que é a necessária tranquilidade e serenidade que a nação e as famílias querem para efetivamente se poder ter o exato contexto em que a tragédia aconteceu", considerou.
De igual forma garantiu que "não há a terceirização de responsabilidades" neste caso, pedindo "a necessária serenidade para aguardar os resultados do inquérito".
"Não há demissão dos governantes em relação aos seus papéis, como aqui foi dito na declaração política. E não há silêncio algum em relação a este facto e em relação a esta questão. O anúncio do inquérito que é uma responsabilidade principal e primeiro foi feito. O inquérito está a ser feito. É preciso acreditar que as Forças Armadas, enquanto organização apolítica, não poderia nunca fazer um inquérito político", afirmou.
"E é preciso, e nós estamos a oferecer esta garantia, de que o inquérito será rigoroso e que, obviamente, a perícia externa, toda ela, será feita e realizada para que se tenha em devido alcance tudo quanto se mostra necessário", acrescentou.
Para a ministra, que tutela os Assuntos Parlamentares e a Defesa Nacional, é necessário "valorizar as Forças Armadas" do país.
"Não é por acaso que existe a credibilidade e a confiança na instituição. O serviço militar obrigatório existe e é preciso confiar e acreditar que os filhos prestam um serviço e voltaram a casa. Aconteceu um acidente. Aconteceu um trágico acidente. Cabo Verde tem a agradecer às Forças Armadas, aos filhos das ditas famílias, porque são eles que efetivamente nos acodem. São eles que efetivamente garantem a defesa. São eles que efetivamente respondem e nos acodem quando a gente precisa", concluiu.
Este incêndio destruiu quase 850 hectares de terreno rural e florestal, segundo o levantamento feito pelo investigador Nuno de Santos Loureiro, diretor do mestrado em Sistemas de Informação Geográfica da Universidade do Algarve, e provocou "perdas irreparáveis" em espaço rural e florestal que se estendeu pelos concelhos de Santa Catarina e Tarrafal.
De acordo com o levantamento, com recurso a imagens de satélite do programa europeu Copernicus antes e depois do incêndio, foram destruídos 846,8 hectares, área que corresponde a 0,85% da totalidade da ilha de Santiago.
PVJ // LFS
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