“Está a ser cada vez mais difícil e complexo aprovar Orçamentos, e estes cada vez mais serão inconsistentes, sobretudo em governos de maioria relativa, se nada for feito entretanto”, defende o ex-deputado independente da bancada do PS no seu último livro, intitulado “Democracia em Portugal – Como evitar o seu declínio”, editado pela Almedina, que será lançado na quinta-feira.
Para o professor do ISEG, que se “divorciou” do PS na fase final da última legislatura e passou a deputado não inscrito, “a primeira responsabilidade do ‘complicómetro’ orçamental é do Governo”.
“Se olharmos para as últimas décadas, o Orçamento é cada vez mais extenso, tem cada vez mais artigos, alguns dos quais nada têm que ver com o Orçamento propriamente dito (a tal autorização de receita e de despesas)”.
Como exemplo, indica que a média de artigos passou de 76, na IX legislatura, para 430, na XIV, em 2019. Nessa altura, a proposta de lei inicial do Governo tinha 287 artigos e o contributo dos partidos (da oposição e o PS) foi acrescentar-lhe 49,8% de artigos novos.
E Paulo Trigo Pereira entende que “muitas dessas propostas, do Governo ou dos partidos, “nada têm que ver com o Orçamento em sentido estrito”.
“São tantas que até já têm uma designação própria: os ‘cavaleiros orçamentais’. São normas que ‘cavalgam’ em cima do Orçamento de Estado ou porque são meros enunciados programáticos, ou porque ultrapassam as competências da Assembleia da República, imiscuindo-se nas funções executiva e administrativa do Governo”, sustenta.
Os casos das normas sobre o Metro de Lisboa e a linha circular ou da regulamentação dos emolumentos a pagar nos registos e notariado de alteração do nome aquando dos processos de mudança da menção do sexo das pessoas transgénero, são alguns dos casos indicados pelo economista para ilustrar a sua opinião.
A razão é, segundo o ex-deputado, simples: quando os governos são minoritários “terão mais necessidade de fazer promessas aos partidos que vão viabilizar esse Orçamento” e, então, “para que as coisas fiquem claras, lá se põe mais uma norma” no OE.
“A tendência, a manter-se, mostra que, se nada for feito, haverá deterioração da qualidade dos orçamentos, porque o tempo que os deputados e as outras instituições têm para analisar a proposta de lei inicial do Governo é muito maior do que o tempo que existe para ler e pensar sobre as propostas de alteração, que muitas vezes são apresentadas e votadas sem qualquer debate público”, argumenta.
Para resolver o problema, Paulo Trigo Pereira propõe “uma solução política” e “outra técnica, que a complementa”.
A solução para que a proposta de lei do OE seja aprovada com alterações em grande medida coerentes e consistentes é simples: O Governo ter uma maioria política parlamentar, mesmo em coligação”, defende.
Também ajudará, acrescenta, que a Constituição, ou apenas a Lei de Enquadramento Orçamental, “restrinja a possibilidade de ‘cavaleiros orçamentais’ e que o Regimento da AR torne o processo orçamental mais coerente”.
Apesar de alguns avanços nos últimos anos, como a criação de instituições como o Conselho de Finanças Públicas ou a Unidade Técnica de Apoio Orçamental (UTAO), o antigo parlamentar adverte que “os OE estão a tornar-se cada vez mais complexos, o que resulta de propostas aprovadas com uma geometria política variável, derivada em parte da natureza do Governo minoritário”, concluindo que “tal não aconteceria com um Governo com sólida base parlamentar”.
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