A troca de argumentos sobre o Novo Banco dominou toda a primeira ronda da líder do BE, Catarina Martins, na interpelação ao primeiro-ministro, António Costa, durante o debate sobre política geral que decorre no parlamento.
“A pergunta que eu tenho, senhor primeiro-ministro, é perante as evidências apontadas pelo Tribunal de Contas e tendo em conta a determinação da Assembleia da República, se o senhor primeiro-ministro se compromete a não tomar qualquer decisão de injeção sem debate e aprovação pelos deputados. Mais, se se compromete que o Fundo de Resolução não fará nenhuma injeção sem autorização pelo parlamento”, questionou.
Na resposta, António Costa disse que nunca assumirá tal posição, considerando que este é um “compromisso de violação das obrigações contratuais” e que “Portugal tem que manter a sua credibilidade enquanto Estado de direito”.
“Os contratos são para cumprir. O Fundo de Resolução pode e deve cumprir o contrato na estrita medida em que a verba esteja devidamente prevista e seja justificada do ponto de vista contratual”, assegurou o chefe do executivo.
A coordenadora do BE recordou que o partido conseguiu aprovar no Orçamento do Estado para este ano “que se eliminasse a autorização para o Fundo de Resolução realizar a despesa no Novo Banco”.
“O PS chamou na altura a esta proposta do Bloco de Esquerda uma bomba atómica que iria levar o banco a uma nova resolução. A proposta foi aprovada e não houve uma nova resolução e hoje está provado com os dados que temos que o parlamento tomou uma decisão sensata ao aprovar a proposta do Bloco de Esquerda”, recordou.
O chefe do executivo reiterou que “Portugal é um Estado de direito, onde as obrigações são para cumprir”.
“No Orçamento do Estado, o único compromisso que assumimos é que o Estado não emprestaria dinheiro ao Fundo de Resolução. O Fundo de Resolução encarregou-se de encontrar uma solução alternativas de financiamento”, enfatizou António Costa.
Outro ponto de discórdia entre Catarina Martins e António Costa foi o encargo para os contribuintes das injeções no Novo Banco.
“O encargo destes empréstimos não é do contribuinte. O Estado tem estado a ser o banco dos bancos, o encargo é de quem contraiu o empréstimo e quem contraiu o empréstimo foi o Fundo de Resolução e vai ser pago pelos bancos”, assegurou o primeiro-ministro.
Pelo contrário, Catarina Martins considerou que ficou estabelecido “que o empréstimo é dívida pública e é pago por impostos que são do Estado e, portanto, onera os contribuintes” e que “este ano o Novo Banco não precisa de nenhuma injeção para cumprir os rácios de capital que está obrigado este ano”.
“O que é incompreensível é que o Governo ainda não tenha tratado com a Lone Star de garantir que não há nenhuma injeção que como já ficou aqui estabelecido também onera sempre os contribuintes, num ano em que nem sequer é preciso para cumprir rácios de capital. Essa passividade do Governo face a algo que onera o Estado e os contribuintes é que é inaceitável, ainda mais no período que atravessamos”, condenou.
Costa fala em “história muito triste” e reafirma que dinheiro do Estado será recuperado
O primeiro-ministro considerou hoje que o Novo Banco tem "uma história muito triste", admitiu que havia razões para duvidar sobre a qualidade dos seus ativos financeiros e afirmou que o dinheiro injetado pelo Estado será recuperado.
António Costa falava no final da primeira ronda do debate bimestral sobre política geral, na Assembleia da República, depois de uma intervenção do vice-presidente do Grupo Parlamentar do PS João Paulo Correia com críticas ao PSD e Bloco de Esquerda sobre o Novo Banco.
Na resposta, o líder do executivo disse orgulhar-se da ação do seu Governo em 2016 e 2017 ao nível das políticas adotadas para o sistema financeiro, depois de ter recebido "uma pesada herança", desde logo com a perspetiva de liquidação do Banif, mas também com a reputação do Estado Português em causa como resultado de decisões tomadas para o Novo Banco pelo Banco de Portugal no final de 2015.
"Em março de 2017, de facto, não havia nenhuma solução boa: A liquidação era péssima; a nacionalização significava importar para o Estado ilimitadamente todos os riscos relativos ao Novo Banco; e havia a possibilidade de negociar com um único verdadeiro interessado nas condições que impunha para a sua aquisição. Mas também dúvidas sobre a qualidade de ativos e, infelizmente, estes anos têm demonstrado que tinham razão de ser", admitiu o líder do executivo.
Neste contexto, António Costa frisou que, em matéria de Novo Banco, o país "está perante "uma história muito triste".
"Aprendi com o professor Jorge Leite a frase de que é muito difícil endireitar a sombra de uma vara torta", assinalou, dizendo então, em seguida, que o seu executivo procurou fundamentalmente assegurar que o Novo Banco "não entrava em liquidação, que não havia riscos sistémicos ou desestabilização do sistema financeiro".
"O Governo colocou um risco máximo de responsabilidade de 3,9 mil milhões de euros e, ainda, que essa responsabilidade é assegurada pelo fundo de resolução - entidade que é financiada em condições que não colocam em causa a sustentabilidade do conjunto do sistema bancário através das contribuições a receber até 2046. Este não é um empréstimo gratuito, mas oneroso, porque o Estado cobra juros", salientou o primeiro-ministro.
De acordo com o líder do executivo, até ao momento, o Estado já cobrou 588 milhões de euros "e muitos milhões de euros cobrará até à liquidação final do empréstimo".
"Quando eu disse que não serão os contribuintes a suportar, digo e repito: O dinheiro que hoje o Estado adiantou é o dinheiro que o Estado vai recuperar com juros para os contribuintes", assegurou.
Neste ponto, António Costa apontou ainda "ganhos colaterais" por parte do Estado Português ao ter seguido o caminho da venda do Novo Banco.
"Assistiu-se a uma estabilidade do sistema financeiro e a uma ausência de risco sistémico e ganhos que se traduziram numa descida significativa da taxa de juro da República, o que tem poupado ao Estado muitos milhares de milhões de euros ao longo destes anos", advogou o primeiro-ministro.
Neste contexto, deixou um aviso: "Não podemos correr o risco de voltar a perder a credibilidade internacional e, por isso, temos de manter uma gestão prudente ao mesmo tempo que recusamos a austeridade".
Antes, o vice-presidente da bancada do PS João Paulo Correia tinha acusado o presidente do PSD, Rui Rio, de tresler a auditoria realizada pelo Tribunal de Contas ao Novo Banco e, por outro lado, de a "menorizar, insistindo numa segunda queixa à Procuradoria-Geral da República.
"Estamos perante o embaraço para o PSD e para o CDS. Como também é um embaraço para estes partidos lembrar que quem o Banco de Portugal contratou para vender o Novo Banco foi Sérgio Monteiro, ex-governante da coligação PSD/CDS-PP. Esta ideia de colocar Sérgio Monteiro é a mesma coisa do que colocar uma raposa à porta do galinheiro", atacou o dirigente da bancada socialista.
João Paulo Correia fez também críticas ao Bloco de Esquerda a propósito do processo do Novo Banco, depois de manifestar estranheza por o PSD agora admitir, "de forma intelectualmente pouco honesta, a nacionalização deste banco".
"O PS disse que a atribuição de prémios de gestão no Novo Banco era imoral e o plano de reestruturação proíbe-os. O Bloco de Esquerda sabe disso, mas preferiu atacar o Governo", acrescentou.
[Notícia atualizada às 17:37]
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