“O mecanismo ibérico existe, mas as aprendizagens que temos vieram de apenas alguns meses da sua aplicação e apenas num lugar bastante peculiar, na Península Ibérica, por isso penso que seria bastante arriscado introduzir uma enorme medida revolucionária desta forma”, reagiu o responsável pela equipa de Energia da BEUC, Jaume Loffredo, questionado pela Lusa.
Falando num encontro com jornalistas europeus a propósito da reforma da conceção do mercado de eletricidade da UE, dias antes de a Comissão Europeia apresentar a sua proposta, na próxima quinta-feira, Jaume Loffredo apontou que o executivo comunitário vai “concentrar-se em mudanças rápidas através de contratos diferenciados, em acordos de compra de energia e em melhorias dos direitos dos consumidores, em vez de introduzir mudanças ambiciosas na legislação sem ter provas práticas”.
“Para nós, o que é importante […] é como alcançar o objetivo de assegurar que os consumidores tenham preços estáveis e acessíveis. O que a Comissão parece estar a propor fazer é introduzir contratos diferenciados para novos geradores de energia renovável e, na nossa perspetiva, esta é uma melhor forma de abordar a questão”, acrescentou o responsável.
A posição surge depois de Portugal ter sugerido a criação de uma cláusula de emergência para toda a UE, como acontece com o mecanismo ibérico, e de a Comissão Europeia ter salientado os riscos e as diferentes realidades energéticas entre os Estados-membros.
No início deste ano, a Comissão Europeia lançou uma consulta pública, entretanto concluída, sobre a reforma da conceção do mercado de eletricidade da UE, cuja proposta será divulgada na próxima quinta-feira para melhor proteger os consumidores da excessiva volatilidade dos preços, facilitar o seu acesso a energia segura proveniente de fontes limpas e tornar o mercado mais resiliente.
O Governo português defendeu, numa posição submetida ao executivo comunitário durante a consulta pública, que “para além do funcionamento regular do mercado, há uma necessidade de enquadrar a extrema volatilidade do mercado”.
“Uma solução seria prever uma cláusula de emergência”, apontou o executivo no documento de trabalho a que a Lusa teve acesso, salientando que a prática, através do mecanismo ibérico, “provou que a colocação de um limite máximo nos preços de mercado provou ser eficaz” e com “resultados muito positivos”.
Porém, questionado pela Lusa, um alto funcionário da Comissão Europeia vincou que “a medida espanhola e portuguesa para baixar os preços da eletricidade durante a crise energética foi considerada justificada pelas circunstâncias particulares do mercado grossista de eletricidade ibérico”, dada a “limitada capacidade de interligação, […] bem como a elevada influência do gás na fixação dos preços” da luz.
No que toca ao resto da UE, “os Estados-membros são muito diversos no que diz respeito aos seus ‘mix’ energéticos, ligações e sistemas de energia”, adiantou o responsável à Lusa.
Na atual configuração do mercado europeu, o gás determina o preço global da eletricidade quando é utilizado, uma vez que todos os produtores recebem o mesmo preço pelo mesmo produto — a eletricidade — quando este entra na rede.
Na UE, tem havido consenso de que este atual modelo de fixação de preços marginais é o mais eficiente, mas a acentuada crise energética, exacerbada pela guerra da Ucrânia, tem motivado discussão, dada a dependência europeia dos combustíveis fósseis russos.
Desde meados de maio passado, está em vigor um mecanismo temporário para limitar o preço de gás na produção de eletricidade na Península Ibérica até final de maio de 2023.
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