Segundo as conclusões da investigação independente, liderada pelo antigo ministro da Educação Tiago Brandão Rodrigues, e realizada aos incidentes no e em torno do Stade de France, em Paris, na vitória do Real Madrid ante o Liverpool (1-0), é a UEFA, “como detentora do evento, que comporta responsabilidade primária pelas falhas que quase levaram a um desastre”.
No documento, a que a Lusa teve acesso, também é apontado o dedo às autoridades policiais da capital francesa e à Federação Francesa de Futebol (FFF) pelos problemas de segurança registados em 28 de maio de 2022, bem como a dificuldade em “manter a ordem”, o que ainda assim “não absolve a UEFA de responsabilidades”.
A ‘colagem’ dos britânicos a ‘hooligans’, adeptos violentos, foi “inexplicável”, adianta o relatório, depois de estes terem sido inicialmente incriminados pelo Governo francês aquando dos desacatos, em maio do ano passado.
A vasta lista de conclusões do comité de investigação independente, liderado por Brandão Rodrigues, elenca a má gestão do volume de pessoas a chegar pelas várias entradas do recinto, defeitos nos acessos, grupos de locais que atacaram adeptos, tentando provocar confrontos, o mau policiamento e a falta de planos de contingência.
A mudança abrupta do local de realização, de São Petersburgo (devido à guerra na Ucrânia) para Paris, foi outro fator apontado, além de questões como a bilhética, de um sistema duplo que introduziu confusão e problemas aos bilhetes falsos e a tentativa de forçar entrada por pessoas sem bilhete, são críticas deixadas no penúltimo capítulo do documento, ainda que a questão quanto a ingressos forjados (ou inexistentes) não seja conclusiva quanto à importância na disrupção do evento.
As críticas sucedem-se aos vários momentos, incluindo-se o adiamento do pontapé de saída, devido aos confrontos e ao 'caos' que introduziu no acesso às bancadas, mas a forma "confusa" como este ocorreu não escapa, bem como a falta de comunicação desta medida para fora do estádio.
A Convenção de Saint-Denis, criada pelo Conselho da Europa para mudar o paradigma de segurança em eventos desportivos para uma abordagem integrada que coloca de parte o foco em fenómenos de violência, é apontada como um exemplo, e uma "obrigação partilhada" de UEFA e autoridades locais competentes, que não foi respeitada.
O comité deixa um total de 21 recomendações fundamentadas para UEFA e autoridades, depois de ficar claro, quanto aos incidentes no Stade de France, que "o ocorrido na final da 'Champions' foi largamente o resultado de mau planeamento, falta de supervisão, pobre interoperabilidade entre os vários 'stakeholders' e falta de contingências".
"Concordamos, neste aspeto, com as conclusões do Senado de França. Contudo, como detentor do evento, é da nossa opinião que foi, em última análise, a UEFA que tinha a responsabilidade pelo falhanço destes vários 'stakeholders' para que cumprissem a sua obrigação partilhada de respeitar a Convenção de Saint-Denis", lê-se no documento.
Assim, o modelo de policiamento para a final era "inconsistente e desajustado ao propósito", com uma abordagem "demasiado securitizada, com ações unilaterais por parte da polícia" e ideias "mal concebidas quanto a ameaças à ordem pública", má cooperação e o uso excessivo de gás lacrimogéneo e outro material dispersor.
A transparência, melhores práticas de cooperação, supervisão e vigilância, bem como de auto-escrutínio por parte dos organismos competentes, integram a lista de recomendações ao organismo de cúpula do futebol europeu, com outras, relativas à resposta de segurança e ordem pública, deixadas à polícia e à autarquia de Paris.
Um relatório anterior tinha apontado já para falhas organizacionais e no policiamento da partida, o jogo de maior cartaz do futebol europeu de clubes, e um dos maiores eventos desportivos mundiais, lembrando a proximidade da realização dos Jogos Olímpicos Paris2024.
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