São jovens. Quatro ao todo. Com idades entre os 15 e os 18 anos. Vivem no Algarve. São velejadores do Clube de Vela de Lagos, somam títulos nacionais, participações em provas internacionais e sonham com algo mais. Um sonho presente, embora o presente passe sobretudo por outras vias, pela escola e pelos estudos. Mas o futuro pode perscrutar horizontes mais distantes.
Dois são irmãos. Marta, 15 anos e Manuel Fortunato, 18. O Frederico Baptista, 18, juntou-se ao Manuel. A Beatriz Gago, 17, à Marta. Fazem duplas em 420, uma classe pré-olímpica.
Marta e Manuel são filhos de Martinho e Ingrid Fortunato. Ele antigo campeão mundial da classe que os filhos escolheram para praticar. Eles, o casal, formaram, em tempos, uma dupla dentro de água. Hoje, para além da paternidade, assumem a lides de treinadores dos quatro jovens velejadores.
Estudos: o plano A da vida
Marta e Beatriz, Manuel e Frederico dedicam-se de alma e coração à vela na classe cuja embarcação comporta dois tripulantes. Uma paixão que serve de antídoto a uma atividade solitária a quatro mãos.
A privação de uma vida normal, em especial, aos fins de semana, faz parte da rotina. Uma abdicação, consciente, de muita coisa, feita com muito sacrifício (pessoais e financeiros, deles, dos pais e dos treinadores), mas sem lamúrias e lamentos.
“Treinamos quatro horas em cada um dos dias do fim de semana. E, normalmente à sexta-feira, após as aulas, embora, este ano, a escola tenha roubado demasiado tempo de treino nesse dia”, atesta Frederico, que com Manuel a seu lado são campeões nacionais juniores (terceiro lugar absoluto).
Depois dos treinos “não sobra muito tempo. Organizo a minha vida ao sábado e domingo sem essas oito horas dentro de água e o descanso que temos de ter”, indica. “Se não fosse a vela não tinha as notas que tenho. É um pilar para mim”, sustenta o velejador que quer velejar para sempre, embora goste de pensar que plano A da vida é “outro” e passa por seguir “engenharias”, atira numa conversa tida com o SAPO24 na Marina de Lagos.
Marta, bicampeã nacional, júnior e em absoluto (ao lado de Beatriz), é assumidamente tímida, uma timidez que acusa quando não enfrenta ventos e marés. A conta-gotas afirma que a vela aporta-lhe “um raciocínio mais rápido para a vida”.
Jogos Olímpicos no horizonte
Sem vedetismos, antecipa, com uma trepidação na voz, que entra nos barcos para “passar o tempo” e para “divertir-me”. E que não perde o sono a pensar numa ida aos Jogos Olímpicos. “Se acontecer...”, acontecerá, um condicional de esperança secreta que transporta na mente.
As palavras que não lhe saem e que são quase sempre interrompidas com um sorriso nervoso, são ditas, em jeito de elogio, pelo irmão Manuel. “É um fenómeno. É campeã nacional júnior e sénior. Foi ao campeonato Mundial Absoluto de 420, em Newport, Rhode Island, nos Estados Unidos da América e aos Mundiais da Juventude. E diz que não liga nada à vela”, solta uma gargalhada.
Sem rodeios, Beatriz, que soma três títulos nacionais em Optimist e um quarto lugar no mundial dessa mesma classe, atesta que a vela “faz parte” da sua vida. Nos barcos desde os sete anos está “a viver o momento” e não descarta um dia desfilar numa cerimónia olímpica. “Vou trabalhar para isso”, remata.
Um objetivo que não é posto de parte por Frederico e Manuel.
A dupla masculina recorda, com orgulho, a sensação do “peso de levar a bandeira às costas”. Aconteceu no Mundial da Juventude, no Texas, em julho de 2018. “Ganhámos a primeira regata do mundial”, exclama Manuel. “Se tivesse que apontar um momento alto é esse. Nem sequer tínhamos pensado nisso. Os barcos e as velas são iguais para todas as equipas e são os skills (capacidades) que fazem a diferença. É como se fosse a medalha de ouro”, reconhece Frederico. “No final ficamos em nono lugar”.
Com o GC32 Racing Tour (campeonato mundial e segunda etapa do circuito europeu de catamarãs que passa por quatro cidades costeiras e um lago) a assentar arrais em Lagos até domingo, os quatro jovens velejadores têm privado com as mais diversas estrelas da vela mundial, incluindo campeões olímpicos e mundiais, vencedores da America’s Cup e da Volvo Ocean Race. Marta Fortunado foi mais longe e a sorte foi ter com ela. “A minha irmã foi para a água treinar com eles”, desvenda, orgulhoso, o irmão, Manuel Fortunato.
“Estes eventos trazem contactos com pessoas experientes, que passaram por diversas classes e partilham conhecimentos”. Mas acima de tudo “é um reconhecimento do sítio onde treinamos. Se estão cá, é porque é bom”, destaca Frederico Baptista que deixa uma nota final: “no Algarve temos condições para treinar o ano todo”.
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