O Santuário de Fátima assinalou neste 13 de outubro a solenidade da sagração da Basílica de Nossa Senhora do Rosário. Na sua homilia, D. José Ornelas, bispo de Leiria-Fátima e presidente da Conferência Episcopal Portuguesa (CEP), lembrou a importância do local.
"Na sua arquitetura, a Basílica abre-se, como que abrindo os braços para acolher os peregrinos, conduzindo-os pelo local da revelação de Maria aos pastorinhos, para o altar da Eucaristia e para a Casa de Deus que está presente, não só aqui, mas em cada uma das nossas igrejas, nas nossas paróquias, nas nossas cidades", apontou, perante os 150 mil peregrinos presentes no recinto do Santuário de Fátima para a última grande peregrinação do ano.
Partindo do exemplo do rei Salomão, na inauguração do templo de Jerusalém que ele mandara edificar, o bispo lembra que um santuário serve "para afirmar que o Senhor do Universo não se mantém longínquo, mas quer e vem habitar no meio do seu povo, no centro da cidade onde vivem aqueles que creem no seu poder e na sua bondade".
"É por isso que o povo acorre ao santuário, que se torna local de reunião e reafirmação da sua fé e da sua identidade como “povo de Deus”. É o lugar onde se vem pedir perdão a Deus, mas também aos irmãos, sentando-se e e rezando juntos", completou D. José Ornelas.
Todavia, nenhum santuário por si só é espelho do povo de Deus. "Salomão tem consciência de que o santuário que mandou construir não é verdadeiramente a 'casa de Deus', porque nenhuma construção humana, diz ele, pode conter ou limitar a sua grandeza, o seu coração que abraça o mundo inteiro. De facto, quando o templo foi destruído, Deus continuou a falar ao seu povo de Israel pelos profetas. A fé nessa Palavra do Deus vivo e presente constitui a força desse povo, com ou sem um templo de pedra, por mais sumptuoso que seja".
Passando para a vida de Cristo, o bispo de Leiria-Fátima frisou ainda que Jesus" é o verdadeiro templo, o 'Emanuel' – 'Deus connosco', que não está fixo em nenhum lugar da terra, não é limitado por nenhuma ideologia nacional e vai ao encontro de todos, especialmente dos que estão nas periferias sociais, económicas e existenciais".
"Os templos de pedra de nada servem se não forem expressão da presença poderosa e carinhosa do Senhor Jesus", lembrou. Nesse sentido, "também as nossas igrejas têm de ser lugares que jorram vida, que cuidam, curam, reconciliam e saram feridas de vida, propondo novos caminhos de vida".
Recordando, que habitualmente, os peregrinos ficam pouco tempo no santuário e regressam para as suas vidas, D. José Ornelas referiu-se àquele espaço como "os modernos estacionamentos à beira das estradas", para os "carros elétricos dos nossos dias, que fornecem a oportunidade de encontrar carregadores do amor de Deus que vem ao nosso encontro e nos permite continuar a caminhada da vida até ao encontro definitivo com Ele no verdadeiro santuário da vida que não tem fim".
Quase no final da sua homilia, o presidente da CEP frisou que Maria "ensina-nos a ser Igreja unida na mesma fé e a caminhar juntos, como Igreja sinodal para levar Cristo ao mundo", remetendo posteriormente para o tema da Jornada Mundial da Juventude que acontece em Lisboa em agosto de 2023.
"Foi isso que ela fez logo depois de aceitar o chamamento de Deus para ser a Mãe de Jesus. Diz S. Lucas que ela não se fechou no santuário da sua casa, mas 'partiu apressadamente' para a montanha, para ir levar Cristo ao mundo", lembrou.
Salientando que foi essa mesma atitude que se viu em Fátima, com a revelação de Nossa Senhora aos pastorinhos, D. José Ornelas afirmou que a vida daquelas crianças não foi fácil, tendo até passando pela pandemia da gripe espanhola.
Por sua vez, apontou ainda que "Jesus não disse que o caminho da Igreja ia ser fácil, mas disse que ia estar connosco até ao fim dos tempos".
No final da celebração, o reitor do Santuário de Fátima, padre Carlos Cabecinhas, anunciou aos peregrinos que foi entregue esta manhã, no Dicastério para as Causas dos Santos, em Roma, "a Positio Super Vita, Virtutibus et Fama Sanctitatis do processo de Beatificação e Canonização da Serva de Deus Maria Lúcia de Jesus e do Coração Imaculado". Com isto, está dado mais um passo para o processo. A notícia foi recebida no recinto com uma salva de palmas.
O reitor recordou que a Irmã Lúcia de Jesus se considerava “a primeira peregrina de Fátima”, tendo sido sempre uma “presença discreta” nos dias de peregrinação internacional.
As celebrações começaram às 09:00, com o rosário internacional, na Capelinha das Aparições, e, às 10:00, foi iniciada a missa que terminou com a Bênção aos Doentes e procissão do Adeus, no altar do recinto.
Segundo dados do Santuário, foram registados 110 grupos organizados de 26 países para participação nesta peregrinação aniversária de outubro, que assinala a sexta aparição da Virgem aos videntes Jacinta, Francisco e Lúcia, “com particular destaque para o chamado ‘milagre do Sol’".
Na quarta-feira à tarde, a conferência de imprensa que antecedeu a peregrinação teve como tema dominante os abusos sexuais na Igreja Católica, com o bispo, também presidente da Conferência Episcopal Portuguesa, a reconhecer que estes são acontecimentos dramáticos que “não têm desculpa”, considerando que qualquer “número é sempre demasiado” e uma derrota.
José Ornelas tem estado nos últimos dias em foco devido à divulgação, pelo jornal Público, de que está a ser investigado pelo Ministério Público por eventual “comparticipação em encobrimento” de casos de abusos sexuais sobre crianças numa cidade da província moçambicana da Zambézia e de outra por um caso alegadamente ocorrido na arquidiocese de Braga.
Na conferência de imprensa, o prelado declarou-se “tranquilo”, frisando não ter havido “nenhuma manobra de encobrimento” e não ter sido contactado pelo Ministério Público.
À noite, perante milhares de fiéis, evocou Sophia de Mello Breyner para explicar aos peregrinos de Fátima qual deve ser a atitude da igreja nos tempos de hoje e que se resume a encarar os problemas de frente.
“Vemos, ouvimos e lemos… não podemos ignorar”, citou José Ornelas, na homilia da celebração da palavra desta noite no Santuário de Fátima, acrescentando que “esta tem de ser também a atitude da Igreja, que invoca Maria como sua Mãe”.
“Como Igreja, temos de estar na linha da frente do estar atento, do proteger, da estar próximo a todas as fragilidades. Essa é a nossa missão, nascida e modelada pelo amor paterno/materno de Deus presente em Maria, Mãe e modelo do agir humano”, defendeu.
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