Segundo o despacho de acusação do MP, a que a agência Lusa teve hoje acesso, o arguido, à data dos factos com 26 anos e colocado na Esquadra de Carnaxide da Divisão Policial de Oeiras, deslocou-se no carro de patrulha juntamente com outro polícia à Estrada Nacional 117, n.º3, junto à rotunda de Queluz de Baixo, após comunicação, via rádio, de desacatos na via pública.
Chegados ao local, na madrugada de 23 de março, o arguido avistou um grupo constituído pelos quatro jovens, dois dos quais, à data, com 15 anos, acompanhados de, pelo menos, mais seis elementos, cujas identidades as autoridades não conseguiram apurar, que seguiam apeados a atravessar a passagem superior da via de acesso ao IC19.
A acusação relata que o arguido parou a viatura enquanto o outro PSP “encetou a perseguição apeado, munido da espingarda 'shotgun' municiada com balas de borracha”. Após este agente “ter dado ordem de paragem de viva voz e efetuado dois disparos para o ar”, os jovens “não acataram e prosseguiram a fuga apeada”, dirigindo-se para uma zona com vegetação densa.
Ato contínuo, o arguido, também uniformizado e munido de uma arma de fogo, de marca ‘Glock 19’, calibre 9 milímetros, “encetou a perseguição apeada”. No momento em que abordou novamente os quatro elementos proferiu as expressões: “para, polícia, para, coloquem as mãos no ar”, mas estes “não acataram a ordem de paragem e prosseguiram a fuga apeada”, conta o MP.
Assim que o arguido alcançou os ofendidos, junto de uma rede de vedação, “identificou-se, proferindo em alta voz a expressão ‘polícia’ e deu ordem para os mesmos pararem, deitarem-se no chão e colocarem as mãos no ar atrás da cabeça”, mas os suspeitos voltaram a não acatar a ordem.
“Nesse momento, o arguido decidiu parar os ofendidos, os quais se encontravam de costas, recorrendo ao uso da arma de fogo que lhe estava atribuída”, sustenta o MP, acrescentando que o arguido “empunhou a arma de fogo” e efetuou cinco disparos na direção dos quatro elementos, tendo atingido e ferido três deles e perfurado o casaco do quarto.
A acusação sublinha que “não foram encontradas armas na posse” dos quatro ofendidos.
As lesões provocadas pelos disparos originaram 180 dias com incapacidade para o trabalho geral e escolar, em dois dos ofendidos, e 126 dias no terceiro.
Segundo o MP, o arguido atuou “com o propósito concretizado de molestar fisicamente os ofendidos, que se encontravam impedidos de se defenderem".
“Bem sabendo que era agente da Polícia de Segurança Pública e que se encontrava no exercício de funções, qualidade da qual se aproveitou para agir daquela forma, excedendo o poder do seu cargo e violando os deveres inerentes à sua qualidade de agente de autoridade, agindo assim com abuso de autoridade”, frisa o despacho de acusação.
O MP salienta que o arguido recorreu ao uso da arma de fogo “sem estar a ser ofendido corporalmente ou ameaçado na sua integridade física, nem foi confrontado com qualquer arma que tivesse sido empunhada pelos ofendidos”, pelo que, “poderia ter adotado comportamento distinto relativamente ao uso da arma de fogo” que lhe estava atribuída.
“Poderia e era-lhe possível, o arguido efetuar disparos para o ar, acompanhado da advertência oral aos ofendidos com vista à sua imobilização e dispondo ainda de outros meios menos perigosos para impedir a fuga, mormente, devia ter existido comunicação via rádio com os outros agentes da PSP, solicitando mais reforços e organizando o cerco e captura”, frisa o MP.
O arguido está atualmente a prestar serviço na Direção Nacional da PSP.
Contactado pela Lusa, Ricardo Serrano Vieira, advogado do arguido, disse que está a avaliar se vai ou não requerer a abertura de instrução.
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