“O que aprendemos e vivemos com esta pandemia, quer na área da saúde, quer em outras áreas, social, económica, também nos preparou melhor para uma nova situação, mesmo que não seja de pandemia, pelo menos de um agente que possa causar uma emergência de saúde a nível global”, disse a investigadora à agência Lusa, nas vésperas de se assinalarem cinco anos da declaração da pandemia de covid-19 pela Organização Mundial da Saúde.

No Laboratório Nacional de Referência para o Vírus da Gripe e outros Vírus Respiratórios, que coordena desde 2009, Raquel Guiomar destacou os ganhos que se obtêm para a investigação com a partilha de dados em tempo real como aconteceu durante a pandemia.

“Estávamos a atualizar as recomendações em tempo real e penso que essa cultura de partilha de dados para o bem global ficou instalada. Hoje em dia, acho que a comunidade científica está muito preocupada em rapidamente partilhar resultados críticos que possam beneficiar também ações na área da saúde. E penso que, dessa forma, ganhamos todos”, declarou.

Durante a pandemia, Raquel Guiomar liderou a equipa que estava alerta 24 horas por dia para dar resposta a todas as áreas – diagnóstico, investigação, estudos de raiz para responder a questões na área da saúde pública.

Apesar de o laboratório já estar a atuar de forma a responder à epidemia, a virologista disse que “o primeiro embate foi a declaração de emergência (…), com todo o impacto que isso também trouxe na gestão da vida pessoal e social”.

Atualmente, o SARS-CoV-2 é tratado como mais um vírus respiratório que circula na população, estando integrado de forma sistemática no programa de vigilância das infeções respiratórias virais.

Embora o número de casos de SARS-CoV-2 tenha diminuído significativamente nos últimos tempos, não deixou de ser uma preocupação: “Relativamente a outros vírus respiratórios, foi detetado numa proporção mais reduzida”, mas isso não significa que não possa surgir outra situação nos próximos meses.

“Daí a grande importância da existência de sistemas de monitorização que estão ativos, quer o vírus circule, quer não circule” para tomar as medidas necessárias caso se registe o aumento de circulação de algum dos vírus, para prevenir essencialmente a doença mais grave.

Atualmente, as atenções estão viradas para o vírus H5N1, que representa uma ameaça devido ao seu potencial pandémico.

“Nunca, até agora, o vírus H5N1, de origem aviária, infetou tantas espécies animais, inclusivamente espécies de mamíferos. E, por isso, é atualmente uma preocupação a sua deteção, quer a nível do setor veterinário, quer a nível da população humana”, salientou.

Até agora, não foram detetados casos humanos em Portugal e, mesmo a nível global, eles também são ainda muito esporádicos.

Segundo a virologista, o INSA dispõe de todas as metodologias que permitem detetar o vírus influenza A e o subtipo H5N1, bem como outros vírus de origem zoonótica.

Ali, tem sido feito o diagnóstico laboratorial de todos os casos suspeitos ou que tiveram contacto com animais infetados pelo H5N1 notificados pelos serviços de Saúde Pública.

O coordenador do Departamento de Epidemiologia do INSA, Carlos Dias, destacou a importância da rede de serviços de Saúde Pública nestas situações, defendendo que estes serviços precisam de ser dotados e reforçados com os instrumentos necessários para que o seu funcionamento seja “ágil e o mais moderno possível”.

“Esse é o ponto principal”, afirmou o especialista em Saúde Pública, acrescentando que os orçamentos anuais devem contemplar os recursos técnicos, humanos e financeiros desta rede de saúde pública, constituída por médicos, enfermeiros, técnicos de saúde ambiental, entre outros.

Embora pouco notada, vincou, “essa rede é muito importante porque está mais próxima das populações, tem um contacto mais próximo com o que se passa nas aldeias, nas vilas, nas cidades mais pequenas”.

Por isso, conhece as características e os fatores que podem fazer a diferença quando é necessário mudar comportamentos, alertar pessoas, diagnosticar novos casos que não contactam com os serviços, disse Carlos Silva, realçando a importância desta rede na pandemia.

Explicou que a rede permitiu que o INSA, a Direção-Geral da Saúde e as unidades locais tivessem acesso a dados essenciais sobre novos casos de covid-19, como a idade ou locais onde ocorriam.

“Esse aspeto foi talvez uma das maiores confirmações de que, para darmos resposta rápida, eficiente e com qualidade a pandemias, epidemias, surtos, temos de ter sistemas de informação de boa qualidade, céleres e acessíveis”, frisou.

Para o especialista em saúde pública, os dados têm que estar disponíveis para quem deles precisa, para serem analisados, para que, posteriormente, “o aconselhamento a quem decide esteja disponível”.