Ainda não são 09:30 quando o carro da equipa da unidade de hospitalização domiciliária de Portimão do Centro Hospitalar e Universitário do Algarve (CHUA) para junto à escola primária de Alvor (Portimão), para a primeira visita da manhã, numa ação acompanhada pela Lusa.
Arlindo Batista aguarda em casa os cuidados que os profissionais lhe prestam todos os dias, depois do internamento a que teve de ser sujeito no Hospital de Portimão.
“É uma iniciativa mais que boa. É um serviço que nos dá um paz diferente que estar no hospital” revela.
Para o doente, com 61 anos, o apoio familiar é um os pontos positivos e destaca “a comida” e a “companhia” como contributo para uma recuperação “mais ativa”, diferente de “estar deitado no hospital 24 horas à espera que a máquina trabalhe uma hora” para lhe fornecer o antibiótico.
“A nível emocional é mais fácil que a pessoa se sinta melhor, vá buscar mais força e não se deixar abater tão facilmente. Em casa, há sempre um amigo que passa e o apoio familiar que temos acho que ajuda mesmo na recuperação”, confessa.
Terminada a visita e reforçados os votos para o regresso no dia seguinte, a equipa segue viagem para Alcantarilha (Silves), a quase 28 quilómetros de distância. Pelo caminho há uma passagem no Parchal (Lagoa) para dar alta a uma doente e libertar um vaga para outro paciente.
Nuno Vieira é o médico coordenador do serviço de hospitalização domiciliária de Portimão do CHUA e destaca a “prevenção das complicações associadas ao internamento hospitalar” — infeções, quedas, desorientação e sofrimento por separação da família – como as mais-valias do serviço.
“Se conseguirmos garantir a sua segurança no internamento em casa e que todas as necessidades associadas à sua doença estão a ser cumpridas, é um benefício”, assegura o médico.
Para os familiares há também a “mais-valia” de manterem o “contacto diário com o doente”, aponta, com o acréscimo de cuidarem dele “24 sobre 24 horas” aumentando a probabilidade de que todas as suas necessidades “sejam cumpridas”, além da vantagem neste tempo de pandemia de covid-19 onde as visitas hospitalares ”estão condicionadas”.
O profissional defende que este serviço torna o sistema “mais eficiente”, já que o custo do internamento domiciliário é “claramente mais baixo” que o convencional e tem a vantagem de “deixar camas livres”.
Para além de alguns critérios clínicos que tornam os doentes elegíveis para integrar este serviço, há ainda a limitação de a deslocação não ultrapassar os “30 quilómetros ou 30 minutos da sede da unidade”.
O serviço teve início em maio deste ano, mas já se aponta para um “crescimento” a médio prazo, passando dos cinco para os 10 doentes, à semelhança da unidade de Faro que iniciou o serviço “há dois anos”, e a implementação da telemonitorização para um acompanhamento “mais próximo com os doentes”.
Anabela Ferreira é a enfermeira coordenadora do serviço e destaca a importância de se confrontarem com a “realidade da casa e das condições de vida do doente”, que obrigam a um trabalho de equipa e a “encontrar soluções” para cada caso.
“Os doentes mostram a casa, as suas limitações sociais, as dificuldades na alimentação. Nós temos um conjunto de profissionais interdisciplinares que consegue dar esta resposta muito mais adequada”, realça a enfermeira, já com 24 anos de experiência.
É à porta da casa térrea que a mãe de Joaquim Lopes aguarda a equipa que diariamente presta os necessários cuidados médicos ao filho, instalado num pequeno quarto à entrada da habitação, onde uma cama e uma televisão lhe dão o conforto necessário à recuperação.
A equipa é recebida como se de um amigo de longa data se tratasse e a boa disposição e a forma como o enfermeiro Humberto aborda Joaquim deixam o ambiente mais animado. Todos os dias de manhã a equipa administra a medicação intravenosa, deixando apenas uma injeção para a tarde, que o próprio doente administra.
“No hospital tinha um boa assistência, mas aqui em casa fico mais consistente por ter a família ao pé e sinto-me mais à vontade”, revela Joaquim.
Para o enfermeiro Humberto Ferreira, a ligação com a família permite à equipa obter informações que muitas vezes o próprio doente “não consegue dar”, resultando numa adaptação “muito mais eficaz” no regresso ao domicílio.
As condições de cada casa e o modo de vida de cada família obrigam a um trabalho de pedagogia “gradual” por parte da equipa para que sejam garantidas as condições mínimas necessárias à recuperação, mas o resultado final é de reconhecimento.
“Somos sempre muito bem recebidos, acarinhados e há pessoas que no dia da alta chegam a chorar e a perguntar se não podemos continuar a ir lá. Muitas vivem isoladas e a companhia e a melhoria contínua do estado de saúde traz-lhes algum confronto e segurança”, revela.
Marta Duarte é uma das cinco médicas que compõem a equipa e destaca como as visitas domiciliárias permitem “contactar com a realidade do doente”, percebendo o “tipo de casa”, que apoio a família “lhe pode dar na alimentação e medicação” ou se é necessário “fazer ajustes”.
Nem sempre a ajuda que os familiares asseguram poder dar é “bem como diziam”, havendo trocas de medicamentos e carências alimentares, releva.
“Ao virmos ter com o doente conseguimos melhorar um bocadinho as condições em que vive, para que depois o acompanhamento a longo prazo seja melhor”, afirma.
As equipas são muitos vezes complementadas com nutricionistas, farmacêuticos, terapeutas ou assistentes sociais que procuram tirar dúvidas à família, adaptar a realidade às necessidades do doente ou informar e acionar apoios sociais que completam as carências do agregado.
A médica sublinha a importância de “conhecer o doente e a família”, num complemento à abordagem da medicina interna que procura olhar para o doente “como um todo”.
“Conseguir integrar isso no ambiente social do doente é fantástico, é um experiência muito boa”, assegura.
Comentários