Nesta noite gélida de dezembro, cerca de cem jovens ouvem a ex-deportada que, aos quase 97 anos, ainda fez questão de viajar para explicar o horror de Auschwitz, 80 anos após a libertação pelo Exército Vermelho em 27 de janeiro de 1945.

"Dormíamos 18 pessoas por cama. Por volta das cinco da manhã, a chefe do bloco fazia-nos sair à força, batendo com um bastão. Tirávamos os que morreram durante a noite para contá-los...".

"Eu tinha uma ideia fixa: não posso morrer aos 15 anos", continua, relatando como reencontrou a sua irmã de 17 anos no campo, tão desnutrida que ela mal a reconheceu. "Disse-me: 'Eu não vou viver muito tempo. És jovem, promete-me que, se voltares, contarás a nossa história, para que não sejamos esquecidas pela História.'"

Construído na Polónia ocupada, Auschwitz-Birkenau é o símbolo do genocídio perpetrado pela Alemanha nazi, que resultou na morte de seis milhões de judeus, incluindo cerca de um milhão assassinados no campo entre 1940 e 1945.

Para os adolescentes, que viram as malas, utensílios e cabelos que os deportados tiveram que abandonar antes da sua execução, os barracões cercados por arame farpado, as câmaras de gás e o crematório, o impacto foi direto.

"Falaram-nos dos números nas aulas, mas, aqui, percebemos o que as pessoas realmente viveram", explica Charlotte, de 16 anos, aluna do colégio Saint Jean Hulst, em Versalhes, próximo de Paris, onde os 15 alunos que participaram da viagem partilharam as impressões uma semana depois.

"Como nasci em 2008, não achava que teria a oportunidade de ouvir uma sobrevivente. Fui tocado pelas roupas, pelas malas... Isto deu uma dimensão física ao que eu considerava apenas factos históricos", acrescenta Raphaël, de 16 anos.

O trabalho de preparação foi longo, aconteceu todas as quintas-feiras de manhã: "Não podemos simplesmente levá-los, é preciso prepará-los", explica Camille de Hillerin, responsável pedagógica pelas viagens a Auschwitz.

Foram feitas leituras, visita à sinagoga e ao Memorial do Holocausto em Paris, apresentação de testemunhos em vídeo e aulas sobre o crescimento do antissemitismo na Europa. "Focamos o nosso trabalho na transmissão dos testemunhos e na ideia de fraternidade, que foi destruída pelos campos", acrescenta ela.

Antes de sair do barracão escuro, Esther Senot exortou os jovens ao seu redor: "Se nós, na nossa idade, dedicarmos tempo a alertá-los, é na esperança de que isto não se repita."

"Testemunhas das testemunhas"

Esse é o propósito de levar os jovens hoje a Auschwitz, explica Haïm Korsia, grande rabino de França – país que abriga a maior comunidade judaica da Europa –, que organiza essas viagens da memória há mais de 20 anos: "Eles tornam-se testemunhas das testemunhas."

Mas, em breve, os últimos sobreviventes desaparecerão. Em dezembro, Henri Borlant, o único sobrevivente entre as 6 mil crianças judias da França deportadas para Auschwitz em 1942, faleceu aos 97 anos. Claude Bloch, o  último sobrevivente de Auschwitz em Lyon, faleceu em janeiro de 2024 aos 95 anos.

"Precisamos de refletir sobre uma forma de continuar a transmitir toda esta história às gerações mais jovens, que possuem uma forma diferente de ouvir", avalia Alexandre Borycki, presidente da associação "Mémoire du Convoi 6 et des camps du Loiret" ("Memória do Comboio 6 e dos campos do Loiret"). Para os jovens do século XXI, o Holocausto "torna-se História, como a Antiguidade."

Para envolver os jovens, lançou, em 2021, um projeto de "investigadores da memória" com turmas de estudantes do ensino secundário. O objetivo é encontrar, a partir apenas de um nome, sobrenome e data de nascimento, o máximo de informações sobre pessoas internadas ou deportadas pela estação de Pithiviers.

A partir daí, os alunos "realizam uma espécie de investigação policial", pesquisam em arquivos, fazem chamadas...

Milhares de judeus, detidos em Paris durante a batida policial do Vel'd'Hiv em julho de 1942, foram internados na estação de Pithiviers, de onde foram enviados em seis comboios para Auschwitz. A maioria não voltou.

"Apagar todos os vestígios"

O projeto permite enriquecer arquivos incompletos – sobre o comboio 6, pelo qual 928 pessoas foram deportadas, "temos uma biografia para apenas 350 a 400 deportados", explica Borycki.

Mas também possibilita compreender concretamente o caráter exterminador do Holocausto. Às vezes, "eles não encontram quase nada. Dizemos: 'Entendem o que os nazis queriam fazer ao tentar apagar todos os vestígios destas pessoas?'"

Foi esse o desafio enfrentado pelos alunos do ensino médio de Boulogne-Billancourt, no subúrbio de Paris, que também procuravam informações sobre judeus deportados da sua cidade.

"Havia uma foto de uma criança sobre a qual não sabíamos nada: deixámos na exposição para mostrar que isso também é memória e que, infelizmente, ela pode desaparecer", explica o professor Paul, que prefere permanecer anónimo.

"Ensinar o Holocausto como parte da História tem, necessariamente, menos impacto do que realizar um projeto como este", constata.

Para atingir os jovens da geração digital, a cineasta Sophie Nahum tomou uma decisão radical com a sua série de vídeos "Les Derniers" ("Os Últimos"), em que regista os testemunhos dos últimos sobreviventes do Holocausto: vídeos curtos (de 8 a 10 minutos) e divulgação nas redes sociais, pois "é lá que estão os jovens."

"Os jovens leem pouco ou nada a imprensa, assistem muito pouca televisão. Aos longos documentários históricos nos grandes canais, também não assistem", diz. Por outro lado, "a um episódio de 10 minutos ou um trecho de 2 minutos no TikTok, vão assistir, vão ver vários seguidos e aprenderão algo."

"Difícil"

No fim das suas vidas, o grande temor dos sobreviventes é ver a sua história esquecida após sua morte. Transmitir essa memória já não é fácil.

Em 2023, 140.275 alunos participaram em atividades organizadas na França pelo Memorial do Holocausto, o que leva cerca de 2 mil estudantes por ano a Auschwitz.

Mas no campo Alexandre Borycki faz uma constatação direta: "O mais difícil é encontrar escolas interessadas. Algumas, infelizmente, dizem-nos: 'Sabe, é muito difícil falar sobre isso.'' E isso "ainda mais desde 7 de outubro."

Nunca, desde o fim da Segunda Guerra Mundial, o antissemitismo foi tão elevado no mundo e em França, particularmente desde o ataque sem precedentes de 7 de outubro de 2023, no território israelita pelo movimento islamista Hamas, que desencadeou a guerra em Gaza.

Embora a cineasta Sophie Nahum acredite no potencial do TikTok para transmitir essas histórias, afirmando que "é realmente lá que estão os jovens e onde se alcançam os maiores números", também reconhece os perigos. "É claramente a rede mais violenta, e gerir isso é muito complicado."

O 7 de outubro "mudou muitas coisas que já estavam ali e latentes, mas isso fez a tampa explodir" de um antissemitismo "virulento", diz ela. "Hoje, não há mais nenhum tabu, nem mesmo em relação ao Holocausto; pode-se desejar a morte de um sobrevivente sem qualquer problema."