No relatório “Perspetivas Económicas e Orçamentais 2022-2026”, divulgado hoje, a instituição presidida por Nazaré Costa Cabral, aponta, num cenário de políticas invariantes, para um abrandamento do ritmo de crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) português para 4,8% em 2022 e para 2,8% em 2023, face à expansão de 4,9% em 2021.
Este cenário compara com as projeções divulgadas pelo CFP em setembro, quando projetava um crescimento de 5,1% este ano e de 2,9% em 2023, e fixa-se abaixo das estimativas do Governo de 5,5% para este ano.
No relatório divulgado hoje, o CFP projeta ainda um cenário adverso, no qual o choque no preço dos bens energéticos e de outras ‘commodities’ seria mais persistente e existiria uma disrupção no fornecimento das matérias-primas por parte da Rússia à Europa, estimando que o ritmo de crescimento do PIB abrandasse para 3,5% este ano e para 2% em 2023.
No cenário central, o CFP assinala que, no médio prazo, “a trajetória de recuperação da atividade económica deverá prosseguir a um ritmo mais moderado, convergindo de 2,6% em 2024 para valores em torno do crescimento de longo prazo estimado para a economia portuguesa (1,7%) em 2026”.
No entanto, salienta que “as perspetivas económicas no curto prazo encontram-se sujeitas a elevada incerteza gerada pelo conflito militar entre a Rússia e a Ucrânia, não obstante a situação mais estável nos desenvolvimentos da pandemia por covid-19”.
“À data de fecho de informação deste relatório, são ainda de difícil mensuração os efeitos das sanções colocadas à economia russa, com impacto significativo no preço dos bens energéticos e de outras ‘commodities’ [matérias-primas] e consequente efeito adverso no crescimento das economias dos principais parceiros económicos de Portugal”, sublinha.
Ainda assim, acredita que a economia portuguesa irá recuperar este ano o nível do Produto Interno Bruto (PIB) real pré-pandemia.
“No ritmo de recuperação da atividade económica destaca-se o contributo das exportações de serviços, em particular os relacionados com o turismo, que se espera que recupere o nível de 2019 durante este ano”, refere, apontando também para “o contributo da formação bruta de capital fixo (FBCF), que reflete a absorção de fundos subjacentes ao programa NextGenerationEU — nomeadamente o Plano de Recuperação e Resiliência (PRR)”.
O CFP antecipa uma desaceleração do ritmo de crescimento do consumo privado em volume para 3,6% em 2022 e para 2,9% em 2023, refletindo um “aumento das pressões inflacionistas”, e “o aumento moderado da poupança por motivos de precaução”.
No que toca às exportações de bens e serviços, espera um abrandamento para 10,4% em 2022 e para 5,5% em 2023, “que deverá traduzir a expectativa de desaceleração do crescimento das exportações de bens, penalizado pelo aumento dos custos de produção e de transporte e pela diminuição da procura externa”.
“Este efeito deverá ser parcialmente mitigado pela dinâmica das exportações de serviços, em particular aqueles associados ao turismo, que deverão continuar a trajetória de recuperação do nível pré-pandemia, impulsionadas pelo levantamento das restrições à mobilidade internacional e pela retoma da confiança associada à estabilização da situação pandémica”, refere.
Já a FBCF (investimento) em volume deverá crescer 6,9% em 2022 e 4,2% em 2023.
O CFP perspetiva uma trajetória de diminuição gradual da criação de emprego, de 1,1% em 2022 até 0,1% até ao final de 2026, em linha com a dinâmica de recuperação da economia.
Prevê ainda que a taxa de desemprego diminua de 6,4% da população ativa em 2022 até 5% em 2026.
A instituição vinca que as projeções têm riscos macroeconómicos e orçamentais descendentes, destacando “os impactos, ainda que indiretos, provocados pelo conflito militar entre a Ucrânia e a Rússia e a consequente imposição de sanções económicas a este país”, bem como “a possibilidade de execução do PRR abaixo do considerado, o que levaria necessariamente a um fluxo de investimento inferior ao projetado, gerando menos produto”.
Aponta ainda a evolução da situação pandémica, assim como as responsabilidades contingentes relacionadas com as linhas de crédito com garantia do Estado, a eventualidade de a TAP poder vir a beneficiar de apoios financeiros adicionais aos aprovados no âmbito do Plano de Reestruturação, a possibilidade de utilização do montante remanescente de 485 milhões de euros ao abrigo do Acordo de Capitalização Contingente do Novo Banco e as pressões orçamentais sobre a despesa corrente primária.
CFP revê em baixa estimativa do défice para 3% do PIB em 2021
O Conselho das Finanças Públicas (CFP) reviu em baixa de 1,2 pontos percentuais a estimativa para o défice em 2021 para 3% do PIB, antecipando, num cenário de políticas invariantes, uma redução para 1,6% do PIB este ano.
No relatório “Perspetivas Económicas e Orçamentais 2022-2026”, divulgado hoje, os peritos em finanças públicas atualizam a estimativa de défice para 2021, de 4,2% do PIB, divulgada em setembro, para 3%.
A meta do défice do Governo para o ano passado é de 4,3%, mas o ministro das Finanças, João Leão, já sinalizou que deverá ter ficado abaixo do esperado.
“O atual cenário orçamental de médio prazo em políticas invariantes aponta para uma trajetória de correção do défice orçamental e de regresso a uma posição de equilíbrio orçamental semelhante à alcançada um ano antes da eclosão da crise pandémica”, refere o relatório do CFP.
Num cenário de políticas invariantes, ou seja, na ausência de novas medidas de política e que não incluem medidas para mitigar o impacto da subida da energia, a instituição presidida por Nazaré Costa Cabral estima um défice orçamental de 1,6% do PIB este ano.
A explicar esta evolução estão “a reversão da quase totalidade das medidas de política orçamental de resposta ao covid-19 adotadas em 2021 e estimadas em 2% do PIB”, bem como “um abrandamento do crescimento económico”.
Para 2023 e 2024, projeta a continuação de uma trajetória de redução do défice orçamental, para 0,6% e 0,1% do PIB, estimando, a partir de 2025, “uma estabilização do saldo em torno do equilíbrio orçamental”.
“Para esta evolução contribui o regresso, a partir de 2022 (inclusive), a uma trajetória de excedentes primários interrompida em 2020 e 2021”, justifica.
No entanto, alerta para que “o aumento das pressões inflacionistas face aos anteriores exercícios de projeção do CFP pode conferir uma alteração determinante para a trajetória de evolução de algumas variáveis orçamentais”.
“Um fenómeno de inflação não totalmente antecipado tende a beneficiar as contas públicas no muito curto prazo. Tal sucede sobretudo em 2022, ano para o qual os agentes económicos poderão não ajustar no imediato as suas decisões de consumo e investimento, beneficiando a receita fiscal, em particular nos impostos que incidem sobre o consumo dos agentes económicos”, refere.
Relativamente ao peso da dívida, o CFP estima uma redução até ao final de 2026, atingindo 102,7% do PIB. Esta evolução representa uma diminuição de cerca de 25 p.p. do PIB face a 2021, esperando uma queda para 120,2% do PIB este ano e para 115% em 2023.
No entanto, o CFP assinala que existem riscos como “a possibilidade de que, no caso de incumprimento do devedor, as responsabilidades contingentes relacionadas com as linhas de crédito com garantia do Estado se materializarem num valor de despesa superior” ao previsto, bem como “a eventualidade de a TAP poder vir a beneficiar de apoios financeiros adicionais aos aprovados no âmbito do Plano de Reestruturação”.
Indica ainda “a possibilidade de utilização do montante remanescente de 485 milhões de euros ao abrigo do Acordo de Capitalização Contingente do Novo Banco”, assim como “as pressões orçamentais sobre a despesa corrente primária (designadamente sobre as despesas com pessoal, com pensões e relacionadas com pretensões dos parceiros privados no âmbito de projetos de PPP)”.
“Em sentido oposto, um crescimento das contribuições sociais superior ao das remunerações (tal como se tem verificado no período mais recente), uma maior elasticidade da receita fiscal face às bases de incidência, uma menor execução de investimento público suportado por financiamento nacional ou um crescimento menos acentuado das prestações sociais poderem traduzir-se numa evolução mais favorável do que o projetado para o saldo orçamental neste horizonte temporal”, refere.
Disrupção no fornecimento de matérias-primas faria inflação disparar para 5,6% em Portugal
A inflação deverá acelerar para 3,9% este ano, em Portugal, mas num cenário adverso, em que existe uma disrupção no fornecimento das matérias-primas por parte da Rússia à Europa, poderia atingir os 5,6%, estima o CFP.
No relatório “Perspetivas Económicas e Orçamentais 2022-2026”, divulgado hoje, o Conselho das Finanças Públicas (CFP) antecipa “uma aceleração expressiva da taxa de inflação”.
No cenário central, a instituição presidida por Nazaré Costa Cabral vê o Índice Harmonizado de Preços no Consumidor (IHPC) a acelerar para 3,9% em 2022, seguido de uma desaceleração para 2,2% em 2023, “em linha com a evolução esperada para o preço dos bens energéticos e das matérias-primas”.
“De realçar que a hipótese de pressão inflacionista subjacente a este cenário – observada desde 2021 com a recuperação da procura global, as restrições do lado da oferta e o aumento do preço dos bens energéticos – assume-se de cariz temporário”, nota o CFP.
No entanto, assinala que o conflito na Ucrânia aumentou a incerteza, pelo que calculou um cenário adverso, que refere que não deve ser interpretado como uma previsão, no qual “a magnitude do choque no preço dos bens energéticos e de outras ‘commodities’ [matérias-primas] é superior e mais persistente do que no cenário central, fruto de uma eventual disrupção no fornecimento das matérias-primas por parte da Rússia aos parceiros europeus”.
“O choque nos preços reflete-se em custos de produção e de transporte mais elevados, perspetivando-se que a inflação em Portugal possa atingir os 5,6% em 2022”, estima para o cenário em condições adversas.
Nesse cenário, o IHPC iria reduzir-se para 3,7% em 2023 e para 2,3% em 2024.
O CFP alerta ainda que a persistência de inflação elevada poderá causar pressão adicional para o aumento dos salários na economia.
“O cenário de persistência de inflação elevada poderá causar pressão adicional para o aumento dos salários na economia, que, ao serem refletidos no mecanismo de formação de preços por parte das empresas, poderá criar mais inflação”, vinca.
Numa análise global, o CFP dá nota de que, na sequência das pressões inflacionistas, “perspetiva-se uma alteração, ainda que por ora contida, da política monetária do Banco Central Europeu, quer da política convencional (taxas de juro de referência), quer da não convencional (programas de compra de ativos)”.
“A aceleração da taxa de inflação, que tem vindo a registar-se ao longo dos últimos meses, mas que poderá ainda intensificar-se caso os preços das matérias-primas se mantenham elevados por um período alargado de tempo, poderá conduzir a uma resposta mais rápida e vigorosa por parte dos principais bancos centrais, de entre os quais se destacam o BCE e a Reserva Federal norte-americana”, refere.
Considera, contudo, que “constitui na verdade um risco a subida das taxas de juro”.
“Esta, além de plausíveis consequências económicas nefastas, prejudicando a recuperação económica em curso e aumentando o desemprego, poderia vir a ter no médio prazo pesadas consequências financeiras, especialmente para países altamente endividados, como é o caso de Portugal”, refere, apontando ainda o risco de um aumento da fragmentação financeira na zona euro.
Para o CFP, “mais grave até do que o aumento dos juros” seria o aumento dos ‘spreads’, especialmente nos países com dívida elevada, “uma situação a fazer lembrar a crise (de má-memória) das dívidas soberanas”, apontando ainda para o risco de “um certo enviesamento nacional no mercado de dívida, penalizando sobretudo, de novo, os países mais endividados” no que toca à política de compra de ativos.
“A recuperação das economias, e da portuguesa em particular, neste pós covid-19, está assim agora, neste quadro bélico, fortemente condicionada”, vinca.
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