David Frost vai dizer que propostas para facilitar a entrada de produtos, nomeadamente de salsichas, na província britânica não serão suficientes para resolver as tensões entre o Reino Unido e Bruxelas.
"A Comissão [Europeia] tem sido muito rápida em descartar a governação como uma questão secundária. A realidade é o oposto. O papel do Tribunal de Justiça Europeu na Irlanda do Norte e a consequente incapacidade do Governo do Reino Unido em implementar as disposições muito sensíveis do Protocolo de uma forma razoável criaram um profundo desequilíbrio na forma como o Protocolo funciona”, vai dizer, segundo excertos do discurso avançados à agência Lusa.
Frost pretende deixar claro que, “sem novos ajustes nesta área, o Protocolo nunca terá o apoio de que necessita para sobreviver”.
A visita de Frost a Lisboa, onde se vai encontrar com a secretária de Estado dos Assuntos Europeus, Ana Paula Zacarias, acontece na semana em que a Comissão Europeia pretende apresentar propostas que solucionem os problemas na Irlanda do Norte.
Desde a entrada em vigor, em janeiro, do acordo para o ‘Brexit’ que estão em vigor novos controlos aduaneiros a produtos que chegam do Reino Unido, em particular de origem animal e vegetal, o que também implica documentação acrescida.
O objetivo destas medidas é proteger a integridade do mercado único europeu, pois o acordo deu à Irlanda do Norte um estatuto especial devido à necessidade de manter uma fronteira aberta com a República da Irlanda, membro da UE, para respeitar o processo de paz na região.
Porém, o Governo britânico entende que as novas regras, entretanto suspensas, estão a dificultar a circulação de mercadorias dentro do próprio Reino Unido, do qual a Irlanda do Norte faz parte.
Esta situação foi ilustrada com o potencial impedimento de as tradicionais salsichas britânicas serem importadas para a Irlanda do Norte porque, de acordo com as regras de segurança alimentar da UE, os produtos de carne refrigerada não podem entrar no mercado único de países que não são membros, como é o caso do Reino Unido.
Tensões sobre as novas regras contribuíram para uma semana de violência nas ruas nas cidades da Irlanda do Norte em abril, quando jovens atacaram a polícia com tijolos, fogos de artifício e engenhos explosivos.
Os confrontos criaram receios de um reacendimento do conflito sectário que causou mais de 3.500 mortos ao longo de três décadas, violência que foi interrompida com os acordos de paz de 1998.
Em julho, Londres apresentou um documento no qual exige “alterações significativas” ao Protocolo da Irlanda do Norte do Acordo de Saída da UE, incluindo que deixe de estar sujeito à supervisão e decisões do Tribunal de Justiça europeu.
Na semana passada, o vice-presidente da Comissão Europeia com a pasta das relações interinstitucionais, Maroš Šefčovič, prometeu responder com "soluções práticas”, mas no passado afirmou que não estava disposto a renegociar o Protocolo.
A imprensa britânica noticiou na sexta-feira que serão publicados na quarta-feira quatro documentos com propostas para facilitar a entrada de medicamentos, as inspeções fitossanitárias a produtos de origem animal e a burocracia nas alfândegas.
A UE vai também propor, segundo as mesmas notícias, uma exceção especial para de “produtos de identidade nacional”, o que é visto como uma solução para a questão das “salsichas”, que se tornou numa bandeira das críticas ao Protocolo.
Uma fonte do Governo britânico disse à Lusa que o executivo irá “analisar cuidadosa e construtivamente todas as propostas que a UE apresentar” e que está preparado para negociações “intensas”, mas avisou que “ajustamentos nas margens” do Protocolo não serão suficientes.
David Frost deu na semana passada um prazo até novembro para as negociações darem resultados, senão o Reino Unido pretende invocar o Artigo 16.º do Protocolo, que suspende partes do acordo e que pode agravar o conflito com os 27.
"Ninguém deve ter dúvidas sobre a gravidade da situação”, vai dizer o secretário de Estado britânico na terça-feira em Lisboa, num discurso na embaixada do Reino Unido em Lisboa.
"É por isso que estamos a trabalhar para refletir as preocupações de todos na Irlanda do Norte, de todos os lados do espetro político, para garantir que o processo de paz não seja prejudicado. A UE tem agora de mostrar ambição e vontade de abordar de frente as questões fundamentais que estão no cerne do Protocolo”, vai insistir Frost.
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