Segundo os porta-vozes dos cerca de 90 operacionais da corporação, o conflito resulta da incompatibilidade crescente entre corpo ativo e direção, já que essa última não reconduziu dois adjuntos do comando após o final do respetivo mandato e, desagradado com essa postura, o comandante e o segundo-comandante apresentaram a sua demissão.
A chefia está atualmente entregue ao comando interino do seu oficial mais graduado e, em caso de incêndios de grandes dimensões, ficará legalmente dependente de liderança externa.
O subchefe Amaro Fontes contou à Lusa como se chegou a este ponto: "Depois de a associação humanitária ter afastado os dois adjuntos sem dar razões válidas para já não confiar neles, reunimos [65] assinaturas, pedimos esclarecimentos e a direção nem os deu nem se mostrou disponível para sair. Nessa altura, o comando decidiu demitir-se todo e então foi solicitada uma assembleia-geral de sócios para destituir a direção, caso contrário os bombeiros vão parar em bloco e suspender o serviço de proteção de pessoas e bens".
Para esse subchefe, o afastamento dos adjuntos do comando contra a vontade dos operacionais "foi a gota de água" num relacionamento que já se vinha deteriorando há muito tempo, uma vez que a atual direção está em funções desde 2003 e, "embora ninguém negue que fez um bom trabalho na primeira fase, nos últimos anos tem sido uma vergonha" e vem acumulando críticas.
"Tínhamos um comando excecional - que até fazia mais do que a direção porque, se não fosse assim, os bombeiros não tinham fardamento sequer - e a paga é esta?", questionou Amaro Fontes.
Na lista de reclamações quanto à direção da associação humanitária, Amaro Fontes aborda vários aspetos: "As viaturas estão muito velhas e foi por iniciativa do próprio comando que conseguimos ao menos uma mais recente. Tínhamos no quartel um bar aberto ao público e outro só para o pessoal, e a direção fechou os dois para desmotivar o convívio entre colegas. Não há aquecimento no edifício e passamos lá a noite sem o mínimo conforto. E o exterior está praticamente às escuras porque a direção também mandou cortar a luz".
Este porta-voz dos bombeiros apontou outros exemplos de "abuso de poder" por parte do presidente da associação humanitária: "As viaturas fora de uso estão paradas em casa dele em vez de serem vendidas para obtermos mais fundos. O Mercedes doado à corporação anda ao serviço dele ou nas mãos dos funcionários da empresa que ele tem. E, quando uma sentença judicial determina serviço comunitário no quartel, ele manda logo essas pessoas irem trabalhar para casa dele".
Referindo ainda "um processo em tribunal por assédio sexual a uma colaboradora", Amaro Fontes considerou que "é tempo de se fazer uma limpeza na direção porque já ninguém aguenta mais isto e é o bom nome de toda a corporação que está na lama".
Manuel Regal, outro subchefe que representa os Bombeiros Voluntários de Lourosa, realçou que o corpo ativo "já devia ter feito uma revolução há muitos anos, mas foi-se mantendo calado porque o comando estava sempre a acalmar os ânimos".
Com o afastamento e a renúncia dos elementos da chefia operacional, no entanto, essa tolerância "deixou de fazer sentido e os bombeiros uniram-se em defesa do antigo comando", pelo que os documentos a pedir esclarecimentos foram assinados por toda a corporação "exceto pelos assalariados da casa - já que o presidente da direção disse que se se metessem nisso os despedia".
Manuel Regal assegurou que, "por enquanto, a corporação está a trabalhar normalmente e continuará a apoiar o comandante interino que tem agora em funções", mas avisou que "esta foi realmente a última gota de água e, se a direção não se demitir nem a assembleia-geral tomar medidas, outra possibilidade é a maioria do corpo de bombeiros pedir a inatividade".
Contactado pela Lusa, o presidente da associação humanitária dos Bombeiros Voluntários de Lourosa, Joaquim Cardoso, não quis prestar declarações.
Os Bombeiros Voluntários de Lourosa têm como área geográfica de intervenção prioritária a cidade a que a sua designação faz referência e outras 10 freguesias do concelho de Santa Maria da Feira: Argoncilhe, Canedo, Fiães, Gião, Mozelos, Nogueira da Regedoura, Sanguedo, Santa Maria de Lamas, São Paio de Oleiros e Vila Maior.
A assembleia-geral destinada a analisar a situação do comando operacional e o desempenho da atual direção ainda não tem data definida, mas o documento solicitando essa reunião foi assinado por 57 sócios da corporação.
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