Desde domingo, em incidentes separados, registaram-se vários feridos, na sequência de distúrbios no Bairro da Jamaica, no Seixal, que motivaram uma manifestação contra excessos policiais, na segunda-feira, em Lisboa, junto ao Ministério da Administração Interna.
Em declarações à agência Lusa, Massunga Henriques, da direção da Associação de Desenvolvimento e Defesa dos Angolanos em Portugal, considerou que "houve claramente excessos da polícia", mas recusou atribuir ao episódio qualquer conotação racista.
"A atuação da polícia não foi a mais correta possível. Agrediu membros da mesma família, exagerou naquilo que deveria ser a sua ação, mas em função do histórico do bairro e de ideias preconcebidas" que tem sobre ele, disse.
Para Massunga Henriques, quando a polícia é chamada a estes bairros, já vai preparada e predisposta para "uma intervenção corpo a corpo".
O responsável da associação, criada em 1997 e que apoia as comunidades angolanas em Portugal, sustenta que a polícia tem "mecanismos para atuar de forma diferente" e que é urgente "criar uma operação de diálogo" com as populações dos bairros sociais.
Massunga Henriques, que está a acompanhar a família alegadamente agredida pela polícia durante a intervenção no bairro, sustenta que estes incidentes são mais um sinal do mal-estar e da falta integração destas comunidades motivada pela falta de oportunidades e por problemas que se arrastam há anos.
"Temos indivíduos que vivem aqui há anos, não têm ligação ao país de origem, os filhos já nasceram cá, mas não têm autorização de residência, nem são considerados portugueses. Por isso, na manifestação de segunda-feira não vemos só a questão da agressão, estamos a ver a questão das minorias e de como são tratadas", disse.
Para o dirigente da associação, este episódio podia acontecer com qualquer minoria estrangeira, porque, sustentou, está relacionado com a forma como a polícia lida com a diferença, ignorando o "contexto de falta de oportunidades destas populações para sair da pobreza".
Para Massunga Henriques, "está na hora de olhar a sério para a integração" das minorias que, segundo disse, representam "uma força de trabalho" que não pode ser ignorada.
Reclama, por isso, uma postura diferente da polícia - a começar pela linguagem - quando faz intervenções nestes bairros, e também uma "reflexão profunda" sobre a forma como são tratadas as comunidades minoritárias.
E, neste contexto, defende a importância das associações como mediadoras entre as populações e as autoridades e instituições, papel que já foi mais ativo, segundo disse.
"Já fomos mais interventivos. Desde há oito a 10 anos que essa intervenção é menor porque se criou a falsa sensação de que as coisas estão controladas e que os atores sociais não são precisos", disse.
"As associações podem ajudar a polícia porque estamos nos bairros, vivemos nos bairros todos os dias", reforçou.
Quatro pessoas foram detidas na segunda-feira, no centro de Lisboa, na sequência do apedrejamento de elementos da PSP por participantes numa manifestação em frente ao Ministério da Administração Interna, convocada para dizer "basta à violência policial” e “abaixo o racismo”.
Este protesto realizou-se um dia depois de incidentes em Vale de Chícharos, conhecido por bairro da Jamaica, no Seixal, distrito de Setúbal, entre a PSP e moradores e dos quais resultaram feridos cinco civis e um polícia, sem gravidade, tendo sido detida uma pessoa, entretanto libertada.
Na noite de segunda-feira e na madrugada de hoje, a esquadra da PSP no bairro da Bela Vista, em Setúbal, foi atingida por ‘cocktails molotov’, enquanto na Póvoa de Santo Adrião, em Odivelas e na Cidade Nova, distrito de Lisboa, foram incendiados caixotes do lixo e diversas viaturas, segundo a PSP, que anunciou a detenção de uma pessoa.
A polícia não estabelece uma relação entre os incidentes registados no centro de Lisboa e nas restantes zonas.
O Ministério Público abriu um inquérito aos incidentes no bairro da Jamaica e a PSP abriu um inquérito para “averiguação interna” sobre a “intervenção policial e todas as circunstâncias que a rodearam”.
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