
Pedro Vásquez, padre diocesano de 82 anos e um dos amigos mais próximos do pontífice na diocese de Chiclayo, no Peru, onde Robert Prevost foi bispo, diz ao El País que o Papa Francisco foi um mentor para Leão XIV, mas que este "não se chamou Francisco II para não incomodar os cardeais conservadores".
"[O Papa Francisco] Deu-lhe um trabalho complicado quando chegou a Chiclayo. Aqui, a Igreja está polarizada entre os mais adeptos da teologia da libertação e os mais tradicionalistas. Prevost tem um bom pulso para lidar com coisas complicadas: é simples, mas tem uma mão firme", acrescentou ainda.
Para este padre que considera Leão XIV como um irmão, a chegada a Papa foi um caminho natural na vida de Prevost. "Quando ele foi nomeado cardeal em 2023, brinquei com ele no WhatsApp: 'É um sinal que o Papa deu para que mais tarde sejas outra coisa'. E ele respondeu: 'Nem penses nisso!'".
"Deixámos de trocar mensagens desde antes do conclave. Como tinha de estar incomunicável, não o queria incomodar. Agora estou a hesitar sobre como me devo dirigir quando lhe escrever para o felicitar novamente: Robert, Santo Padre?", questiona.
Sobre o pontificado, não tem dúvidas das suas prioridades. "Tal como Francisco, a sua prioridade será a imigração", afirma.
"No primeiro mandato de Trump, com a sua política de separação de famílias de imigrantes em 2018, pronunciou-se com veemência contra o presidente dos EUA. 'Como é possível que mães sejam separadas de seus filhos', perguntou indignado", recordou.
Por outro lado, vê também possíveis mudanças dentro da Igreja, como na formação de padres. "Ele quer que os seminários não ensinem uma teologia doutrinária e de cima para baixo, mas uma teologia do 'Deus connosco'. É um agostiniano e vai seguir a máxima de Santo Agostinho de que a Igreja deve ser sempre reformada".
Outro exemplo é a participação de mais mulheres em algumas funções na Igreja. "Quando chegou [ao Peru], perguntou porque é que os acólitos das paróquias tinham de ser homens. Abriu a porta às mulheres acólitas", diz Vásquez.
"Tem um jeito reservado, mas não quer dizer que seja tímido. Gosta de falar, mas ouve mais do que fala. E, quando tem de entrar, aprofunda as questões", remata.
O motivo para o nome Leão XIV
Num discurso perante o Colégio Cardinalício, o antigo cardeal Robert Prevost assumiu o nome de Leão inspirado por causa de "Leão XIII, com a histórica Encíclica Rerum novarum, [que] abordou a questão social no contexto da primeira grande revolução industrial”.
Hoje, “a Igreja oferece a todos a riqueza da sua doutrina social para responder a outra revolução industrial e aos desenvolvimentos da inteligência artificial, que trazem novos desafios para a defesa da dignidade humana, da justiça e do trabalho”.
No encontro com o Colégio Cardinalício, o primeiro depois da eleição, na quinta-feira à tarde, disse que pretende liderar com o apoio de todos.
“Queridos cardeais, vós sois os colaboradores mais próximos do Papa, e isto é de um grande conforto para mim, que aceitei um fardo claramente muito superior às minhas forças, assim como o seria para qualquer outra pessoa”, afirmou.
“A vossa presença recorda-me que o Senhor, tendo-me confiado esta missão, não me deixa sozinho a carregar tal responsabilidade”, acrescentou.
Cada Papa “é um humilde servo de Deus e dos irmãos, nada mais do que isso”, disse Leão XIV, elogiando o antecessor, com o seu "estilo de total dedicação ao serviço e sobriedade essencial na vida”.
“Nos últimos dias, pudemos ver a beleza e sentir a força desta imensa comunidade, que com tanto carinho e devoção saudou e chorou o seu pastor, acompanhando-o com a fé e a oração”, afirmou. “Vimos qual é a verdadeira grandeza da Igreja, que vive na variedade dos seus membros”.
Na mesma intervenção, Leão XIV renovou a “plena adesão a este caminho, que a Igreja universal percorre há décadas na esteira do Concílio Vaticano II”, o encontro mago dos anos 1960 que marcou mudanças estruturais da relação da instituição com o mundo contemporâneo.
E, assumindo-se como herdeiro ideológico de Francisco, criticado por setores mais conservadores pelo discurso de abertura, Leão lembrou alguns pontos da Exortação Apostólica Evangelii gaudium, que assinalou o início do Pontificado anterior.
“Gostaria de sublinhar alguns pontos fundamentais: o regresso ao primado de Cristo no anúncio, a conversão missionária de toda a comunidade cristã; o crescimento na colegialidade e na sinodalidade; a atenção ao sensus fidei [sentido mais profundo da fé], especialmente nas suas formas mais próprias e inclusivas, como a piedade popular; o cuidado amoroso com os marginalizados e os excluídos; o diálogo corajoso e confiante com o mundo contemporâneo nas suas várias componentes e realidades”, salientou o Papa aos cardeais.
O cardeal Robert Francis Prevost, de 69 anos, foi eleito na quinta-feira Papa, após dois dias de conclave, na Cidade do Vaticano, e assumiu o nome de Leão XIV.
Nascido em Chicago, nos Estados Unidos, o novo líder da Igreja Católica tem ascendência espanhola e nacionalidade peruana, e pertence à Ordem de Santo Agostinho, tendo sido bispo de Chiclayo (Peru) e foi prefeito do Dicastério para os Bispos.
Leão XIV sucedeu ao Papa Francisco, que morreu em 21 de abril, aos 88 anos.
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